Minha avó…
Trilhar os caminhos nos passos seguros, maduros e firmes de alguém que já viveu tanto, e tem tanto a nos ensinar, é uma grande graça. Desde a infância tive a oportunidade de morar com os meus avós paternos, e ter uma convivência muito próxima e familiar com meus avós maternos e meus bisavós, todos para mim viveram essa fase da vida madura exemplarmente. Tive muitos exemplos de santidade que me ajudaram muito na minha caminhada, vou citar aqui o da minha avó paterna, com a qual moramos durante muitos anos eu, meus pais e irmãos.
Meu avô paterno faleceu quando eu era muito nova, no entanto minha avó viveu ainda muitos anos, e foi sempre o ponto de referência da família, mestra na vida de fé e espiritualidade. Observando ela aprendi muito, lições de fé que ajudaram a fundamentar minha vocação religiosa.
Aquela face marcada pelo tempo que transparecia a verdadeira beleza de uma alma experimentada na intimidade com Deus a ponto de tornar-se a própria oração, assim era minha avó. Os meus olhos de criança ficavam a observá-la se arrumando: o vestido, os sapatos, o guarda-chuva sempre a mão, a fita do apostolado da oração e o véu de renda negro. Todos os dias ela se arrumava assim para ir a Santa Missa. Não sei por quantos anos ela trilhou aquele mesmo caminho e sentou naquele mesmo banco. Observando-a descobri o valor inestimável da Santa Missa diária.
Todos os dias às 14h da tarde ela trilhava aquele mesmo caminho, o terço em uma mão e o guarda-chuva na outra, ela se dirigia agora à Capela da Igreja paroquial aonde todos os dias havia adoração Eucarística para os fiéis, a mim cabia o dever de acompanhá-la para que ela não andasse sozinha, o que na idade dela era muito perigoso. Assim, aprendi a fazer adoração eucarística diariamente. Deus me conduzia, eu a observava, acompanhava, e meu coração de criança começava a ser conquistado por aquele Jesus que se revelava a mim através dos gestos cotidianos de minha avó, de sua devoção e vida espiritual.
Em casa, sentada no sofá da sala, ela fazia crochê e rezava tão absorta na oração, que não percebia quando alguém se aproximava. Meus olhos permaneciam fixos e curiosos a observar aqueles lábios pequenos, dos quais se podia ouvir sair o balbuciar de uma oração incessante. Aquelas pequenas mãos tão ágeis, calejadas e acostumadas ao trabalho duro, agora traziam uma preciosa agulha de crochê. Os olhos claros e vivos por detrás de grossas lentes, sempre concentrados nos pequenos pontos dos quais aos poucos nasciam uma belíssima toalha. O cabelo liso e bem fininho, sempre modestamente preso com um coque, e a oração incessante, como se cada ponto representasse uma conta do terço.
Um dia, ela exortou os netos: “lá no meu quarto existe um grande quadro, não mecham lá para não quebrá-lo”. Deixei-me levar pela curiosidade, e assim quando ninguém estava por perto, decidi que daria só uma olhadinha bem rápida. Bem devagarinho, abri a porta do guarda roupa e dei só uma olhadinha para saber quem, e o que tinha de tão precioso naquele quadro. Havia um homem tão distinto, todo vestido de branco sentado numa cadeira enorme, ele tinha os olhos penetrantes, parecia a imagem de um santo. Mais tarde descobri que o precioso quadro que minha avó guardava com tanto zelo, era do amado São João Paulo II. Foi a primeira vez que meus olhos pousaram sobre sucessor de Pedro. Um amor a Igreja era o que ela nutria, por isso durante toda sua vida foi membro fidelíssimo do Apostolado da oração. Pude acompanhá-lo nas reuniões e encontros do apostolado, e o que mais me marcou foi o ramalhete espiritual de oração que ela todo o mês fazia. Minha avó, só sabia escrever seu nome, simples e profundo como ela: Ana; o ramalhete devia ser entregue na reunião do apostolado da oração, então ela me pedia para preencher o papelzinho. Pude descobri ainda muito mais sobre ela! Quantas Missas, quantas comunhões, terços e mortificações que ela oferecia nas intenções do Apostolado da oração, em desagravo das ofensas cometidas contra os Corações de Jesus e Maria. Orações pela humanidade sofredora, nas intenções do Santo Padre… As suas palavras, aquele pequeno papel ficaram gravados em meu coração.
Os anos se passaram, respondi ao chamado de Jesus, e entrei para vida contemplativa na Ordem de Santa Clara, minha avó pôde ver-me religiosa e presenteou-me com uma linda toalha de crochê para mesa de comunhão. Logo ela faleceu e voou para o céu, assim se foi minha primeira catequista. Seus exemplos estão vivos em meu coração, e sei que lá do céu ela também intercede por mim!
Uma Irmã Clarissa