Clara Agolanti nasceu em 1260, foi educada por seu pai, Onosdeo, no cultivo de um carácter forte, quase masculino, e intolerante a qualquer submissão. Passou sua adolescência entre cavalos e torneios, rebelde nas práticas religiosas que sua mãe Gaudiana tentava inculcar-lhe. Morta a mãe quando ela contava apenas sete anos de idade, seu pai tornou a se casar e ela ficou ainda mais independente. Bem jovem casou-se com o filho de sua madrasta, porém ficou viúva três anos depois, herdando uma imensa fortuna. Durante oito anos continuou se entregando a festas, justas de cavalaria, banquetes, com uma vida frívola e mundana, dando lugar a escândalos e péssimos falatórios na cidade.
Seu pai e seu irmão morreram no mesmo dia, enquanto estavam em guerra com os Malatesta, rivais pelo domínio na zona de Rimini. Deste modo todas as riquezas da família Agolanti se concentraram nas mãos da jovem viúva. Nem mesmo esse duplo luto a tirou da vida dissipada. Foi pedida em casamento por um nobre que levava uma vida relaxada e ela aceitou com a condição de que pudesse manter o mesmo estilo de vida. Aos 34 anos, um fato insólito: um dia, uma força misteriosa, mas irresistível, a obriga a entrar na igreja dos Padres Conventuais, Santa Maria em Trivio, e a rezar um Pai Nosso e uma Ave-Maria, que tem o poder de mudar-lhe a vida: pela primeira vez ela se sentiu perturbada e agitada. Voltou para casa, se fechou em seu quarto, onde caiu no chão num mar de lágrimas de arrependimento, e decidiu mudar de vida. No dia seguinte, depois de uma noite insone, foi à mesma igreja, onde fez uma confissão geral, e a partir desse momento começou uma vida de piedade, boas obras e penitência, convertendo inclusive o marido, que morreu dois anos depois de modo cristão.
Então Clara não pôs limites às suas penitências, que se tornaram terríveis, animada de um desejo de expiação que a devorava. Por debaixo do pobre vestido cinzento usava sobre a carne cilícios e argolas de ferro; dormia em cima de tábuas, alimentava-se de restos que pedia. O seu verdadeiro alimento era a oração e a Eucaristia. Com suas imensas riquezas começou a ajudar a todas as misérias materiais e morais; deu dote e apoio a todas as jovens pobres que desejavam se casar. Quando as Irmãs Pobres foram obrigadas a deixar Reggio, devido às predominantes guerras, foi principalmente os esforços de Clara que foram capazes de obter um convento e meios de sustento para elas em Rimini.
Se por um lado Clara foi agraciada com êxtases e revelações, por outro lado foi vítima de desgraças políticas e teve de se retirar de Urbino, onde se refugiara com um irmão, gravemente enfermo. Nessa cidade foi um anjo de misericórdia para os doentes, pobres e encarcerados. Voltou para Rimini com 12 companheiras; mulheres de grande fervor se reuniram a ela dispostas a levar uma vida de reclusão e penitência. Clara então fundou um pequeno mosteiro chamado Santa Maria dos Anjos – mais tarde conhecido como de Santa Clara. Obteve a bênção do Bispo de Rimini, Guido Abasi, indo em seguida à Catedral para emitir os votos religiosos, de acordo com a Regra de Santa Clara de Assis.
Viveu vários anos como superiora, intensificando os sacrifícios e a contemplação da Paixão de Cristo. O Senhor lhe concedeu o dom de graças místicas elevadíssimas, com êxtases tão profundos, que nenhuma força humana podia deter, e só se recuperava se era levada diante do Santíssimo Sacramento. No dia 10 de fevereiro de 1326, depois de suportar inúmeras provações, entre elas a cegueira e um coma prolongado, Clara faleceu aos 66 anos, consumida pela penitência e pela contemplação, e seu corpo descansa na Catedral da cidade de Rimini.
Seu culto “de tempo imemorial” foi confirmado pelo papa Pio VI em 22 de dezembro de 1784, que permitiu que sua festa seja celebrada na cidade e Diocese de Rimini a 10 de fevereiro. Sua vida é contada em um manuscrito em italiano vulgar, tingido de formas dialetais da Romanha do final do século XV, ainda preservado em Rimini. A legenda foi captada nas suas dobras mais sutis por Jacques Dalarun em um livro de uma força narrativa cativante, Santa e rebelde, que desmonta e monta tempos, espaços, eventos da jornada terrena da Beata.