Contemplando o Cristo Esposo

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Uma das maiores contribuições de Santa Clara para a espiritualidade franciscana é certamente a de ser mestra de contemplação.

Nossa palavra “contemplação” vem do latim cum+templare e recorda que, no tempo dos romanos, os sacerdotes se colocavam dentro do templo, numa situação de envolvimento com (cum) o seu ambiente, para descobrir a vontade dos deuses nos seus auspícios ou augúrios, relacionados com o vôo dos pássaros (auis, mais tarde lido avis) que conseguiam observar pela abertura no teto do templo. Isso pressupunha e favorecia um olhar concentrado e uma busca do sentido divino. Até hoje usamos contemplar para significar um olhar concentrado, por exemplo, na observação de uma flor. E dizemos, também, por exemplo, que um regulamento “contempla” determinada situação, isto é, concentra-se nela, ou a considera. Considerar vem de observar o conjunto (cum) dos astros (sídera) para descobrir uma direção.

O sentido mais estrito de contemplação refere-se a um olhar atento que descobre Deus na presença de suas ações e de suas obras.

Ao pé da letra, contemplar não é orar (de os, oris = boca), nem rezar (de recitare: ler alto ou repetir um texto escrito), mas é um relacionamento excelente com Deus, a quem nós ficamos observando, descobrindo, saboreando. Podemos fazer exercícios de contemplação, mas viver a contemplação é ter essa inclinação para “ver Deus” nos seres e nos acontecimentos.

São Francisco, cujo desejo ardente e apaixonado era ver Deus, a quem descobria em Jesus Cristo, parece ter sido um dos maiores contemplativos da história da humanidade. Aliás, é bom lembrar que todo ser humano tem por natureza o desejo de ver se Deus existe mesmo, de observar onde Ele se encontra ou como Ele vem a nós, ou como podemos nos encontrar com Ele. Mas São Francisco não nos deixou nenhum texto ensinando-nos a contemplar. Clara fez isso.

Foi através da contemplação que Santa Clara se encontrou com o Cristo Esposo e se transformou nele. Foi um “processo de cristificação”, que precisamos entender melhor. Para isso, é bom considerarmos cada vez que a santa usou a palavra contemplar.

Ela fala seis vezes em contemplação, usando sete vezes esse termo. Estão todas nas Cartas dirigidas a Inês de Praga. Vamos ver melhor:

“Com o desejo de imitá-lo, mui nobre rainha, olhe, considere, contemple o seu esposo, o mais belo entre os filhos dos homens (Sl 44,3) feito por sua salvação o mais vil de todos, desprezado, ferido e tão flagelado em todo o corpo, morrendo no meio das angústias próprias da cruz. Se você sofrer com ele, com ele vai reinar; se chorar com ele, com ele vai se alegrar; se morrer com ele (cf. 2Tm 2,11.12; Rm 8,17) na cruz da tribulação vai ter com ele mansão celeste nos esplendores dos santos (Sl 109,3). E seu nome, glorioso entre os homens, será inscrito no livro da vida (Sl 109,3). Assim, em vez dos bens terrenos e transitórios, você vai ter parte na glória do reino celeste eternamente, para sempre, vai ter bens eternos em vez dos perecíveis, e viverá pelos séculos dos séculos” (2CtIn 20-23).

Ela já condiciona a contemplação a um desejo de imitar Jesus, de seguilo. Mas já o trata como um esposo querido e manda considerar o amor que Ele demonstrou quando sofreu por nós. E mostra que essa contemplação vai trazer uma mudança muito grande à nossa vida, com conseqüências para os tempos sem fim.

Nesse trecho, ela fala do que acontece com quem chega à união com Jesus. Para ela, aí está a importância da contemplação do Cristo kenótico e de uma transformação trabalhada nele.

Como já vimos falando da clausura, esse seguimento de Cristo kenótico = esvaziado a ponto de ser encontrado como um servo – é um elemento importante para explicar porque Clara e suas Irmãs quiseram ficar em São Damião presas, pobremente vestidas, sem nenhum poder e sem nenhuma importância.

O trecho seguinte pode ser considerado o mais importante de Santa Clara sobre a contemplação. Aliás, não sei se outra pessoa escreveu algo mais claro e positivo sobre o que é contemplar:

“Ponha a mente no espelho da eternidade, coloque a alma no esplendor da glória. Ponha o coração na figura da substância divina e transforme-se inteira, pela contemplação, na imagem da divindade. Desse modo também você vai experimentar o que sentem os amigos quando saboreiam a doçura escondida, que o próprio Deus reservou desde o início para os que o amam. Deixe de lado tudo que neste mundo falaz e perturbador prende seus cegos amantes e ame totalmente o que se entregou inteiro por seu amor, aquele cuja beleza o sol e a lua admiram, cujos prêmios são de preciosidade e grandeza sem fim. Falo do Filho do Altíssimo, que a Virgem deu à luz permanecendo virgem depois do parto (3CtIn 12-17)”.

Neste texto, aparece uma das maiores originalidades da contemplação de Santa Clara: a contemplação transforma, transforma na imagem da Divindade, em um outro Cristo. Quem transforma é Deus, mas contemplar é expor-se à transformação ao olhar de maneira concentrada para Deus (a eternidade, a glória, a substância divina) através de Jesus que põe Deus ao nosso alcance sendo um espelho, um esplendor, uma figura da Divindade. É por causa da transformação – afinal das contas, no único Cristo, porque não há mais do que um – que a contempladora saboreia a doçura escondida. O núcleo do olhar contemplativo de Clara está em se colocar inteira diante de Cristo Esposo até ser transformada nele. É importante observar que a contemplação une ao Esposo, leva ao prazer de partilhar a visão e o amor com o Esposo.

Na quarta carta, Clara tem um texto magnífico – aliás, impossível de ser traduzido na sua riqueza mais profunda. O que traduzimos por “banquete” também poderia ser traduzido por “convivência, partilha de vida”, e o amor apaixonado de Clara nos faz entrever pelo menos um pouco de todo o prazer que ela já tinha provado saboreando a união com o Esposo:

“Feliz, decerto, é você, que pode participar desse banquete sagrado para unir-se com todas as fibras do coração àquele cuja beleza todos os batalhões bem-aventurados dos céus admiram sem cessar, cuja afeição apaixona, cuja contemplação restaura, cuja bondade nos sacia, cuja suavidade preenche, cuja lembrança ilumina suavemente, cujo perfume dará vida aos mortos, cuja visão gloriosa tornará felizes todos os cidadãos da celeste Jerusalém, pois é o esplendor da glória eterna, o brilho da luz perpétua e o espelho sem mancha (4CtIn 9-14)”.

Neste trecho, aparece outro ponto original da contemplação de Santa Clara: é uma contemplação que transborda de gratidão, a gratidão por chegar a ser unida a Deus, que nos encanta, nos apaixona, restaura, sacia, dá vida, justamente em Jesus, que é seu espelho.

No texto seguinte, Clara desenvolve o que tinha dito no anterior: Jesus é o espelho. Mas ela se espelha nele, ela pode perceber o que falta para ser como ele, é arrastada pelas virtudes pessoais de Jesus. E usando uma linguagem própria do Cântico dos Cânticos, mostra como se revestir de Cristo, do Homem novo.

“Olhe dentro desse espelho todos os dias, ó rainha, esposa de Jesus Cristo, e espelhe nele, sem cessar, o seu rosto, para enfeitar-se toda, interior e exteriormente, vestida e cingida de variedade, ornada também com as flores e roupas das virtudes todas, ó filha e esposa caríssima do sumo Rei. Pois nesse espelho resplandecem a bem-aventurada pobreza, a santa humildade e a inefável caridade, como, nele inteiro, você vai poder contemplar com a graça de Deus.

Preste atenção no princípio do espelho: a pobreza daquele que, envolto em panos, foi posto no presépio! Admirável humildade, estupenda pobreza! O Rei dos anjos repousa numa manjedoura. No meio do espelho, considere a humildade, ou pelo menos a bem-aventurada pobreza, as fadigas sem conta e as penas que suportou pela redenção do gênero humano. E, no fim desse mesmo espelho, contemple a caridade inefável com que quis padecer no lenho da cruz e nela morrer a morte mais vergonhosa (4CtIn 15-23)”.

Ao considerar os momentos mais importantes da vida de Jesus na carne – do presépio até a cruz –, Clara insiste em outro ponto original: sua contemplação é um processo constante, em que a pessoa trabalha com alegria para ser semelhante a Cristo, ou para amar a semelhança que Ele realiza em nós.

Na parte final desse mesmo texto, usando apaixonadamente diversas alusões do Cântico dos Cânticos, Clara chega a pedir “o beijo mais feliz de tua boca”, aquele que, como ensinou São Bernardo, é o próprio Espírito Santo passando entre o beijo dela e o beijo de Jesus como o Espírito Santo é o beijo de amor entre o Pai e o Filho:

“Além disso, contemplando suas indizíveis delícias, riquezas e honras perpétuas, proclame, suspirando com tamanho desejo do coração e tanto amor: Arrasta-me atrás de ti! Corramos no odor dos teus bálsamos (Ct 1,3), ó esposo celeste! Vou correr sem desfalecer, até me introduzires na tua adega (Ct 2,4), até que tua esquerda esteja sob a minha cabeça, sua direita me abrace toda feliz (Ct 2,6), e me dês o beijo mais feliz de tua boca (Ct 1,1) (4CtIn 28-32)”.

É claro que o importante nem é fazer exercícios de contemplação: é estar unido ao Esposo, é ter descoberto e realizado todas as sedes do nosso ser humano. É já ser a esposa que clama com o Espírito, que ela já incorporou totalmente: “Vem, Senhor Jesus, vem!”

Na despedida dessa última carta, ela sublinha o aspecto fundamental da amizade e do amor entre as Irmãs, entre nós todos: nós nos encontramos em profundidade quando nos perdemos na mesma contemplação, na mesma busca de Jesus.

“Posta nessa contemplação, lembre-se de sua mãe pobrezinha, sabendo que eu gravei sua feliz recordação de maneira indelével no meu coração porque você, para mim, é a mais querida de todas” (4CtIn 33-34).

Quem se une ao Esposo na contemplação está construindo sua união com todas as demais pessoas. E a contemplação do Esposo se expressa na capacidade de enxergá-lo nas outras pessoas. E cada pessoa é tanto mais querida quanto mais for possível encontrá-la unida ao Esposo. Por isso, Francisco e Inês de Praga são os maiores amores de Clara.

CaracterísticasA contemplação de Santa Clara – na perspectiva esponsal – é de caráter afetivo. Mas, é preciso sublinhar alguns pontos bem específicos: a). é dominada pela gratidão. b). segue um processo de fidelidade. c). transforma na imagem viva de Deus. d). abre-se para a fraternidade e para a Igreja.  

Contemplação dominada pela gratidão

Seu Testamento começa:

“Entre outros benefícios que temos recebido e ainda recebemos diariamente da generosidade do Pai de toda misericórdia e pelos quais mais temos que agradecer ao glorioso Pai de Cristo, está a nossa vocação que, quanto maior e mais perfeita, mais a Ele é devida” (TestC 2-3).

E o Benefício que dá sentido a todos os outros é o próprio Jesus Cristo.

A gratidão é a admiração sem limites por descobrir-se amada por Deus, por um Deus Esposo, que se dirige a ela de um modo pessoal. Ela quer “pagar” o amor com amor. É a dimensão agradecida da graça. Clara amplia o que Francisco dizia: “Nada de vós retenhais para vós mesmos para que os receba inteiros aquele que inteiro se entrega a vós” (CtOr 29). Ela também escreveu: “ame totalmente aquele que se entregou inteiro por seu amor” (3CtIn 15).

O processo é de fidelidade crescente.

Na segunda Carta, ela escreveu:

“Lembre-se da sua decisão como uma segunda Raquel: não perca de vista seu ponto de partida, conserve o que você tem, faça o que está fazendo e não o deixe, mas, em rápida corrida, com passo ligeiro e pé seguro, de modo que seus passos nem recolham a poeira, confiante e alegre, avance com cuidado pelo caminho da bem-aventurança. Não confie em ninguém, não consinta com nada que queira afastá-la desse propósito, que seja tropeço no caminho, para não cumprir seus votos ao Altíssimo na perfeição em que o Espírito do Senhor a chamou” (2CtIn 11-14).

Ela comunica uma experiência vivida na luta pela fidelidade, pois sofreu não poucas vezes obstáculos que poderiam ter ameaçado sua adesão ao que prometera a Cristo Esposo. A segunda Carta foi redigida durante o generalato de Frei Elias, no meio dos problemas por que estava passando a Primeira Ordem. Foi dentro disso que Clara observou o processo de fidelidade com todas as suas conseqüências e riscos, convidando Inês a uma adesão esponsal diante de qualquer insinuação a sugestão inoportuna:

“Se alguém lhe disser outra coisa, ou sugerir algo diferente, que impeça sua perfeição ou parecer contrário ao chamado de Deus, mesmo que mereça sua veneração, não siga o seu conselho. Abrace o Cristo pobre como uma virgem pobre” (2CtIn 17-18).

Não era uma fidelidade à norma, mas ao seguimento Jesus pobre e desprezível:

“Veja como por você Ele se fez desprezível e o siga, sendo desprezível por ele neste mundo” (2CtIn 19). Pois concluiu, explicitando melhor a contemplação: “Com o desejo de imitá-lo, mui nobre rainha, olhe, considere, contemple o seu esposo, o mais belo entre os filhos dos homens feito por sua salvação o mais vil de todos, desprezado, ferido e tão flagelado em todo o corpo, morrendo no meio das angústias próprias da cruz” (2CtIn 20).

Essa fidelidade a inflamava:

“Tomara que você se inflame cada vez mais no ardor dessa caridade, ó rainha do Rei celeste! Além disso, contemplando suas indizíveis delícias, riquezas e honras perpétuas, proclame, suspirando com tamanho desejo do coração e tanto amor: Arrasta-me atrás de ti! Corramos no odor dos teus bálsamos, ó esposo celeste!” (4CtIn 27-30).

Contemplação transformante

Quando ensinou o que era contemplação, Clara propôs uma verdadeira transformação da pessoa amante na pessoa amada:

“Ponha a mente no espelho da eternidade, coloque a alma no esplendor da glória, ponha o coração na figura da substância divina, e transforme-se inteira, pela contemplação, na imagem da divindade” (3CtIn 12).

É o olhar atento, deliciado, constante, aberto e disponível para aquele que é o espelho, o esplendor, a figura e a imagem da Divindade que nos absorve. Muitos místicos disseram algo semelhante: contemplar o ícone até ser em ícone transformado, como sabemos que foi e é vivido pelos monges do Monte Atos, na Grécia, dedicados à confecção de ícones. Eles se embebem nos ícones e se iluminam no Sol de Deus, acabando eles mesmos ícones vivos iluminados por essa Luz.

Como Francisco, que pediu luz interior ao Crucificado de São Damião, Clara também se tornou luminosa. Seu o olhar de Clara não era exterior ou passivo; era criador porque ela bebia a luz de Deus. Por isso, foi uma viva expressão do processo interior que transforma o contemplativo em imagem daquele a quem contempla com amor.

Clara fez de sua vida a busca desse “Santo Graal”: a “doçura escondida”, reservada por Cristo para os que o amam. Na quarta carta, no lugar de doçura ela fala em delícia. A contemplação clariana, delicadamente esponsal, “é um olhar da alma e do coração para o objeto amado, até ficar embebidos por seu próprio amor e “aderindo a Ele com todas as fibras da alma” em que a esposa é passiva sob a ação do Esposo (4CtIn). Tanto o olhar amoroso inicial como a experiência receptiva em que culmina, são para santa Clara simplesmente “contemplação”.

A contemplação abre para a fraternidade e a Igreja

O Cardeal Ratzinger, hoje Bento XVI, chamou Santa Clara de “anima ecclesiastica, esposa de Cristo” (FormSor 4-5 1990, 239). A contemplação clariana, que leva à transformação esponsal não é uma piedade espiritual que foge do mundo e de seus desafios. Ela evoca a Beleza e o Amor de Jesus para todos, tem uma missão eclesial.

Na mesma carta em que deu a Inês de Praga o ensinamento fundamental do que era contemplação, Clara escreveu este texto notável:

“Eu a considero, num bom uso das palavras do Apóstolo, auxiliar do próprio Deus, sustentáculo dos membros vacilantes de seu Corpo inefável” (3CtIn 8).

Sua fonte, o Apóstolo, é São Paulo, que também disse que era um “espelho da glória do Senhor”, e que de fato se espelhou em Cristo até ser nele também transformado. E também disse que completava e supria o que faltava no Corpo de Cristo, e que considerava os irmãos das diversas comunidades fundadas por ele como “colaboradores” em Cristo (cf. Rm 16,3; 16,9; 16,21; 1Cor 3,9; 2Cor 8,23; Fp 2,25; 4,3; 1Ts 3,2).

Sua contemplação não a afastava da Igreja: levava-a a entrar em comunhão missionária com todos os “gemidos da humanidade e da Igreja, nos membros que “vacilam e caem”. Numa passagem de seu Testamento, falando com as Irmãs, Clara diz outra coisa muito significativa para sua visão de Igreja:

“Pois o próprio Senhor colocou-nos não só como modelo, exemplo e espelho para os outros, mas também para nossas irmãs, que Ele vai chamar para a nossa vocação. Para que também elas sejam espelho e exemplo para os que vivem no mundo” (TestC 19-20).

Clara é mãe de suas irmãs como filha da Igreja; sua maternidade é imagem da Mãe Igreja, que é fecunda, nutre e protege, guia e ensina. É irmã para todos os crentes, companheira na vocação comum, companheira de viagem e apoio. Assim se indica a idéia da comunidade, da “solidariedade” e da suplência. É esposa do Senhor e por isso motivo de alegria, sinal irradiante de esperança para a humanidade.

Uma contemplação iluminada

Na contemplação, Clara tem um ponto bem interessante de comunhão com Francisco: Eles contemplam com os olhos. Ambos falam intensamente de experiências visuais do seu desejo de ver Deus. É nessa linha que vai a sua contemplação do Cristo Esposo, porque quem o vê está vendo o Pai que habita numa altitude inacessível.

Para dar o justo valor a esse particular é bom lembrar que os orientais falam em contemplação com o uso de todos os sentidos. 

Já recordamos que as Irmãs viam em Clara uma experiência parecida com a de Moisés, que “via Deus face a face”. Repetimos os textos mais importantes:

“Era assídua na oração e contemplação. Quando saía da oração, seu rosto parecia mais claro e mais bonito que o sol e suas palavras exalavam uma doçura inenarrável, tanto que sua vida parecia toda celestial” (Irmã Amata de Corozano em ProcC Iv,4).

“…quando ela saía da oração as Irmãs se alegravam como se ela estivesse vindo do céu” (Irmã Pacífica de Guelfúcio, em ProcC I,9).

Isso nos faz lembrar que São Francisco chamou de belos os Irmãos Sol, Lua e estrelas no seu Cântico de Frei Sol, justamente porque eles são luminosos. E nos faz recordar esta importante citação:

“Entre todas as criaturas carentes de razão, amava com afeição maior o sol e o fogo. Pois  dizia: “De manhã, quando nasce o sol, todas as pessoas deveriam louvar a Deus que o criou para a nossa utilidade, porque é por ele que nossos olhos são iluminados de o dia. À tarde, quando anoitece, todas as pessoas deveriam louvar a Deus pelo irmão fogo, pelo qual nossos olhos se iluminam de noite. Pois todos somos como cegos e, por estes nossos dois irmãos, o Senhor ilumina nossos olhos. E assim, devemos louvar o Criador particularmente por essas e pelas outras criaturas que usamos todos os dias” (EP 119,1-3).

É evidente que os “olhos iluminados” dos dois eram os “olhos do espírito” (cf. Adm 1), com os quais eles contemplavam Deus. Por isso, tinham uma visão diferente de si mesmos, do próximo, das criaturas, do mundo e da história.

Como lembra o Evangelho de Lucas:

“A lâmpada do corpo é o olho. Quando o olho é sadio, o corpo inteiro também fica iluminado. Mas, se ele está doente, o corpo também fica na escuridão. Portanto, veja bem se a luz que está em você não é escuridão” (Lc 1134-35).

Chamo a atenção para o fato de que Clara, como Francisco, deve ter tido excelentes oportunidades de contemplar famoso ícone do Cristo de São Damião. Não podemos afirmar que eles tenham tido um conhecimento teórico da teologia que está por trás dos ícones: a teologia da luz. Mas devem ter sido influenciados por ela através do ícone.

A teologia da luz, também chamada de teologia da beleza representa a santidade de Deus como a Luz. É a luz de Deus que deixa os santos iluminados de santidade. É na contemplação da luminosidade dos santos que iconógrafos contemplam a luz que vão passar para os ícones: os seus quadros. E os fiéis tomam um banho de luz de Deus diante dos ícones.

Clara e Francisco contemplativos estão passando para nós a Luz da santidade de Deus.

Fonte: Abrace o Cristo Pobre – Frei José Carlos Pedroso, OFMcap 

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