Desde que ela “conheceu a graça do Senhor Jesus Cristo” com a experiência, “seguindo o exemplo dos santos e frades”, da amargura transformada em doçura, o caminho de quarenta anos de seguimento “junto com os minhas irmãs” ficou claro: Clara insiste em Cristo “Espelho” para se olhar, para se conformar, para se transformar. Dentro do Testamento fala repetidamente da “grande vocação que temos recebido e todos os dias recebemos do Pai das misericórdias” e pela qual “Somos muito obrigadas a bendizer e louvar a Deus”: isto é, ser “colocadas como exemplo e espelho não só para os outros, mas também para as nossas irmãs, presentes e futuras, chamadas por sua vez a ser um espelho de quantos vivem no mundo”
É tornar-se um com Cristo também na “colaboração” para Sua obra de salvação para os “homens, […] muito pobres e necessitados […] da excessiva falta de alimento celestial” (1CtIn) e, portanto, em compartilhar a luta contra “as ciladas do inimigo do homem, que através da pompa de bens momentâneos e glórias falaciosas ele tenta reduzir a nada o que é maior que o céu “(3CtIn 20), e isto é ” a alma do homem que tem fé e que é a morada de Deus” (3 CtIn 21-22).
Tudo isso, Clara confirma com alegria em Inês de Praga:
“Eu me alegro de verdade, e ninguém vai poder roubar-me esta alegria, porque já alcancei o que desejava abaixo do céu: vejo que você, sustentada por maravilhosa prerrogativa de sabedoria da própria boca de Deus, já suplantou impressionante e inesperadamente as astúcias do esperto inimigo […] Vejo que são a humildade, a força da fé e os braços da pobreza que a levaram a abraçar o tesouro incomparável escondido no campo do mundo e dos corações humanos, com o qual compra-se aquele por quem tudo foi feito do nada. Eu a considero, num bom uso das palavras do Apóstolo, auxiliar do próprio Deus, sustentáculo dos membros vacilantes de seu corpo inefável.” (3CtIn)
A compaixão, que enche a vida de Clara segundo o testemunhos em todas as línguas, floresce da partilha com Cristo:
“Se você sofrer com ele, com ele vai reinar; se chorar com ele, com ele vai se alegrar; se morrer com ele na cruz da tribulação vai ter com ele mansão celeste nos esplendores dos santos” (2CtIn)
Um acréscimo nas Fontes Clarianas em alemão medieval diz que, permanecendo em oração depois das completas, Clara “Muitas vezes caiu de joelhos e chorou muito em sua devoção e orou fervorosamente pelos pecadores ” (FC 1781)

E uma fonte fala da compaixão e intercessão de Francisco com o seus frades e Clara com suas irmãs para afastar da cidade de Assis um castigo de Deus, seguindo o exemplo da “liturgia penitencial” feita por toda a comunidade de São Damião pela libertação de Assis das tropas de Vital de Aversa.
Por esta “colaboração” com Deus na luta contra o “inimigo do homem”, ao “inimigo astuto”, aos “inimigos visíveis e invisíveis”, é preciso ser pobre como os Pobres:
“Porque quando se ama uma coisa temporal, perde-se o fruto da caridade. […] Sabeis que não se pode servir a Deus e às riquezas, […]; Sabeis que vestido não pode lutar com nu, pois vai mais depressa ao chão quem tem onde ser agarrado.” (1 CtIn 25-27).
A viagem terrena de Chiara, que poderia ser chamada de “do Domingo de Ramos ao Rei da glória”, conclui com a visão de Cristo Glorioso na Páscoa:
“Também disse que, estando esta Dona Clara perto do final da passagem desta vida, este era a sexta-feira anterior à sua morte, ela disse à testemunha que estava à sós com ela: ‘Você vê o Rei da Glória que eu vejo?”. E isto ela disse várias vezes, e alguns dias depois finalmente expirou.” (ProC IV, 60-61)
Uma vida feita espelho de Cristo e de seu amor desarmado, uma vida que com Ele e Nele “se expõe a inimigos visíveis e invisíveis (RnB XVI, 11) para a salvação de todos os homens.
Fonte: Forma Sororum 2019, n.4